quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Sobre essa tal de Serenidade

Levei tempo pra entender. Fui ensinado a rejeitar. Aceitei, durante muito tempo, que era isso que eu devia combater. Essa inquietação que me atormenta. A curiosidade. A necessidade constante de participar em mudanças inexplicáveis.
Foi-me dito que era isso que me levava pra baixo. Isso que me fazia, em noites descontroladas, beijar a sarjeta. Foi-me dito que, sem nenhuma sombra de dúvida, eu estava errado. E, fragilizado pela perda, pela solidão, pela rejeição daqueles que amo e respeito, pela posição que me foi socialmente imposta, esqueci o que sabia, e aceitei como verdade que a melhor coisa em mim era o que me destruía. Encolhi-me. Escondi-me. Fingi, na cara dura,que não era comigo. Que essa angústia que me move, não existia dentro de mim. Aceitei como um cordeiro, calar-me frente ao caos.
Até que eu entendi. Não era preciso negar essa força. Era apenas necessário, imperioso, que eu aprendesse, com urgência, os meios de conviver com ela. Que eu descobrisse as válvulas de escape corretas. Que eu voltasse a frequentar abismos, e administrasse o medo da queda, com a vontade de saltar. Era necessário, mais uma vez, lamber a lona. Ver o mundo de baixo pra cima, pra ter uma leve mudança de perspectiva. Renovar minhas forças, até pouco escondidas pelas friezas da vida, e estar disposto a encarar aquilo que se espera de mim.
A vida é uma vadia cruel e me levou cegamente pelo caminho mais largo. Não me arrependo, eu precisava caminhar um pouco lado a lado com aqueles que desprezo, pra poder entender que o outro lado da estrada ainda me espera. Que sempre é possível virar à esquerda, dar um breve telefonema, e ir buscar aquilo que te faz feliz. Não que essa tal de felicidade esteja todo dia ao meu lado, mas, ainda acredito que, com um velho caderno no colo, alguns amigos seletos, e a perspectiva de uma noite infinita, é possível chegar perto. Tão perto que até dá pra sentir o gosto.

quarta-feira, 30 de julho de 2014

PROCURADO


Sujeito Implícito
do Pretérito Imperfeito
visto pela última vez
em minhas
mais
ébrias
lembranças

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Ainda guardo algum gosto de noite
no fundo da garganta

Mostro pra mim
que ainda sei os caminhos escusos
ainda encontro os mesmos
becos escuros

Sinto os mesmos cheiros na cidade
visito as mesmas portas
as mesmas
calçadas
as mesas

Ainda desconheço os sabores
daquilo que vem em embalagens bonitas
vestidos de luxo
carros importados

Ainda não sei de onde vim
mas já sei
em definitivo
sem mudanças
Pra onde vou

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Primeiro

Primeiro preciso de calma. Pra tirar de mim essa sensação de ódio.
Caminho pelas ruas becos calçadas
enxorradas
Primeiro preciso de

visualizo sozinho o mudar de cor
do semáforo
observo
bêbado atônito sórdido moribundo
o caminhar do velho perneta da madrugada da afonso pena

Primeiro preciso de um cigarro. Pra tirar de mim esse ar puro.
nasci criei-me cresci
dentro de um cano de descarga
a via que desafoga a combustão da cidade
a via que destransforma a inocência da cidade
na via que

acho no chão
na beirada da calçada
pego
guardo
sinto seu cheiro em noites mais quentes que o usual
mas não toco
não mais
nessa vida de coisas comuns
não há espaço para outras
velhas,
tardias
desculpas

Primeiro preciso de tempo. Pra tirar de mim essa sensação de eternidade.
tic
tac
dentro do peito
falta muito
ainda
tanto tempo que

primeiro preciso
de